Em meio a uma das
maiores crises da democracia recente, Marco Maciel, único
vice-presidente do período democrático vivo (Itamar Franco e José
Alencar morreram em 2011), segue alheio aos acontecimentos. Enquanto o
noticiário da televisão atualiza a situação do processo de impeachment
da presidente Dilma Rousseff e as supostas manobras do vice Michel Temer
para ocupar seu posto, Maciel cerra os olhos em frente à TV e não
expressa qualquer opinião. Aos 75 anos, o mal de Alzheimer, doença que
provoca perda de memória, retirou-lhe a vida social, o entendimento
político, o interesse pelos assuntos públicos.
“Se
lembra de alguma coisa, ele não demonstra nada. Do meio do ano para cá,
ele só responde raramente, e sempre por monossílabos. Se já era calado,
agora é mais ainda. Meus filhos dizem para eu parar, mas sempre comento
com ele: “Viu o que aconteceu com a política, viu isso ou aquilo?”,
recebo de volta o silêncio”, conta a mulher de Maciel, Ana Maria,
companheira de mais de meio século e responsável por comandar a equipe
de cuidadores que se reveza na atenção ao ex-vice-presidente, na sua
residência em Brasília.
De estilo discreto,
Maciel, em média, governou o país por um dia a cada semana que Fernando
Henrique Cardoso esteve na Presidência, entre 1995 e 2002, devido às
viagens do titular. Quando não despachava como chefe de Estado interino,
gostava de ficar em seu gabinete no subsolo do Palácio do Planalto, em
estratégica posição para, literal e figurativamente, não fazer sombra ao
titular.
Sua importância para a
governo tucano fica evidente pela quantidade de menções a ele no
recém-lançado diário de FH para os dois primeiros anos de gestão: Maciel
aparece 122 vezes nas mais de 900 páginas. O então presidente o
qualificava como “coordenador político” do governo no Congresso e não era incomum a romaria de parlamentares ao gabinete do vice.
Foi Maciel quem ajudou a
conter os ímpetos do então senador Antônio Carlos Magalhães, que agia
com eventual rebeldia no Congresso, e a conter crises como o escândalo
da Pasta Rosa, sobre financiamento ilegal de campanha de aliados.
Durante o regime militar, foi um entusiasta da volta à democracia.
Obcecado com o tema da reforma política, que considerava urgente, ele
não pôde acompanhar as discussões comandadas pelo presidente da Câmara,
Eduardo Cunha (PMDB-RJ) sobre o assunto no primeiro semestre deste ano.
“Ele ainda recebe alguns poucos amigos em casa, mas fica sentado e calado durante todo o tempo“, diz Ana Maria, que já chegou a representar o marido em eventos do DEM.
Ocaso
Durante quase 50 anos,
Maciel começava a rotina com a leitura de seis jornais, que recortava e
rabiscava, e partia para suas articulações políticas. Chegava em casa
tarde da noite, mas a tempo de conversar amenidades com a mulher. Perdeu
a primeira eleição aos 70 anos. Depois da derrota, parecia abatido. Uma
depressão começou a ser tratada. Já era sinal de Alzheimer. A doença
evoluiu a ponto de tirar-lhe as iniciativas. Ana Maria precisa prestar
atenção a pequenos sinais para saber se ele está doente ou com fome.
“É
uma pena que você não possa conversar com ele sobre política. Eu sei
que ele gostaria. Vivemos uma ausência de alguém que está presente“, lamenta Ana Maria. (fonte: NE10/foto reprodução)
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